domingo, 31 de maio de 2009

Bons dias (Machado de Assis)

Bom amigos vou termina a semana como comecei com trexo de bons livros este é D+

BONS DIAS!
Hão de reconhecer que sou bem criado. Podia entrar aqui, chapéu à banda, e ir logo dizendo o que me
parecesse; depois ia-me embora, para voltar na outra semana. Mas, não senhor; chego à porta, e o meu
primeiro cuidado é dar-lhe os bons dias. Agora, se o leitor não me disser a mesma cousa, em resposta, é
porque é um grande malcriado, um grosseirão de borla e capelo; ficando, todavia, entendido que há leitor e
leitor, e que eu, explicando-me com tão nobre franqueza, não me refiro ao leitor, que está agora com este
papel na mão, mas ao seu vizinho. Ora bem!
Feito esse cumprimento, que não é do estilo, mas é honesto declaro que não apresento programa. Depois de
um recente discurso proferido no Beethoven, acho perigoso que uma pessoa diga claramente o que é que vai
fazer; o melhor é lazer calado. Nisto pareço-me com o principie (sempre é bom parecer-se a gente com
príncipes, em alguma cousa, dá certa dignidade, e faz lembrar um sujeito muito alto e louro parecidíssimo
com o imperador, que há cerca de trinta anos ia a todas as festas da Capela Imperial, pour étonner de
bourgeois; os fiéis levavam a olhar para um e para outro, e a compará-los, admirados, e ele teso, grave,
movendo a cabeça à maneira de Sua Majestade. São gostos de Bismark. O príncipe de Bismark tem feito
tudo sem programa público; a única orelha que o ouviu, foi a do finado imperador, - e talvez só a direita,
com ordem de o não repetir à esquerda. O parlamento e o país viram só o resto.
Deus fez programa, é verdade ("E Deus disse: Façamos o homem, à nossa imagem e semelhança, para que
presida" etc. Gênesis, I, 26): mas é preciso ler esse programa com muita cautela. Rigorosamente, era um
modo de persuadir ao homem a alta linhagem de seu nariz. Sem aquele texto, nunca o homem atribuiria ao
Criador, nem a sua gaforinha, nem a sua fraude. É certo que a fraude, e, a rigor. a gaforinha são obras do
diabo, segundo as melhores interpretações; mas não é menos certo que essa opinião é só dos homens bons;
os maus crêem-se filhos do céu - tudo por causa do versículo da Escritura.
Portanto, bico calado. No mais é o que se está vendo; cá virei uma vez por semana com o meu chapéu na
mão, e os bons dias na boca. Se lhes disser desde já, que não tenho papas na língua, não me tomem por
homem despachado, que vem dizer coisas amargas aos outros. Não, senhor, não tenho papas na língua, e é
para vir a tê-las que escrevo.Se as tivesse, engolia-as e estava acabado. Mas aqui está o que é, eu sou um
pobre relojoeiro, que, cansado de ver que os relógios deste mundo não marcam a mesma hora, descri do
ofício. A única explicação dos relógios era serem igualzinhos, sem discrepância: desde que discrepam,
fica-se sem saber nada, porque tão certo pode ser o meu relógio, como o do meu barbeiro.
Um exemplo. O Partido, Liberal, segundo li, estava encasacado e pronto para sair com o relógio na mão,
porque a hora pingava. Faltava-lhe só o chapéu, que seria o chapéu Dantas, ou o chapéu Saraiva (ambos da
chapelaria Aristocrata): era só pô-lo na cabeça, e sair. Nisto passa o carro do paço com outra pessoa, e ele
descobre que ou o seu relógio está adiantado, ou o de Sua Alteza é que se atrasara.

Que a nossa semana seja de paz e muito produtiva bjosssssssss

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